quinta-feira, 10 de maio de 2012

Os aros de Carlos



Dois aros permitem ir mais longe. O menino circulava muito, passeava por tudo, absorvia a todos. Bastava estar com seus aros. Estacionado ou a caminho, seus pensamentos pedalavam no ritmo da rua, nos ares da casa.
Se estavam bem, Carlos seguia tranquilo, sem segurar no guidom. Se o ruído entrava, mergulhava de aros e tudo.  Dá-lhe a pedalar pra dentro. Caminho comprido esse. Às vezes, se perdia. Às vezes, se encontrava.
Um dia tiraram as rodinhas de Carlos, pensaram que já era carro: pronto pra correr, se aventurar, abrir trilha em mata fechada. Mas ele era um menino. Só um menino.  E pediu apoio. O vento fez cócegas, o chão foi menos áspero, o horizonte abriu-se generoso e ele seguiu. De aros.
Em dia de curva, na hora de subir ladeira ou acionar o freio pra não bater, lá estava ele, firme com seus aros. Carlos fez-se buzina pra acontecer. E um par de olhos acompanhado de aros vê mais longe, alcança por dentro o dentro das coisas.
Quem olha pra Carlos vê um par de aros. Eu suspeito que sejam flores.

Foto: arquivo pessoal