segunda-feira, 22 de abril de 2013

Estados

 
 
Feito água, mudo.

Freqüentemente estou em estado líquido, derramada. Jorro pra todos os lados e em muitas situações. Uma área alagada ou sujeita a fortes tempestades.

Já fui encontrada sólida, gelada. Não tão raro, uma pedra. Acontece quando perco o chão ou o rebolado. Congelo. Sem ação.

Passado o susto, vaporizo. Torno-me invisível. Por motivo de evaporação, sumiço de mim mesma, ou ebulição, conflito com Deus e todo mundo. Fujo, vagando gasosa por aí.

Há dias que posso trancar-me em estado irreconhecível. Condenso e recomeço a transformação.

Minhas mudanças de estado são feito água, mas ainda chove bastante no meu sertão.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Noutro




Não foi naquele dia. Foi noutro.
Naquele dia eu estava muito distraído. Na mesma sala, mas noutro canto.
Todos eram abraços de saudades, eu de braços cruzados. Todos contavam novidades, eu calava minha notícia. Todos falando de praia, sol e mar, eu era pedra, lua e vento.
Meu material sem lápis e cor. Meu uniforme não estava bem passado. Estava mesmo amarrotado. Virado do avesso.
Naquele dia, vestido de novo, eu estava noutro. Naquele outro, sabe?
Não sabe? Não sei se te conto...
Foi noutro, perto desse, que a novidade me encontrou. A galope levou os dias claros, o sol, a pipa, o futebol. Arrastou os dias de vida mansa, riso frouxo e conversa fiada. Colocou-me em aula, ainda nas férias. Lição difícil.
Passeava por esse dia, quando meus braços descruzaram, a mão caiu sobre a mesa e a dela me alcançou.
Naquele dia, ela fez sumir o outro.
 
Foto: arquivo pessoal
Verso de Pablo Neruda, gravado em pedra, na Cátedra da PUC-RJ