sexta-feira, 29 de outubro de 2010

A renda


Era branca. Uma trama delicada, num lenço pequeno. Tinha cheiro de história. Veio na mala de uma menina do nordeste, que, pela primeira vez, saia de sua cidade para acompanhar o marido. De Fortaleza para o Rio de Janeiro, da casa dos pais para sua própria casa. De um pulo para outro, já era mãe de 4 filhos e avó de 7 netos. E a renda não se rendia ao tempo. Intacta, esperava na mala.

A menina fez sua historia e também aprendeu com ela. De dona de casa à catequista da Igreja do bairro, viu seus filhos e netos seguirem seu exemplo. Uns mais. Outros menos. Mas todos com Jesus no coração. Imagina a alegria desta menina ver sua primeira neta fazer primeira comunhão? Imagina ser ela a voz que anunciaria seu nome no altar da Igreja e ser ela a entregar a Certidão?

Numa cena como essa, a renda tinha que estar lá. Não podia esperar mais nenhum dia, nenhum outro acontecimento. Ia entrar para família pela porta da igreja, carregada no peito da neta. Branca, delicada, estava na hora da sua primeira comunhão.

O vestido das meninas tinha que ser branco. Simples. Sem ostentação. Meia e sapatos brancos. No máximo uma grinalda de pequenas flores brancas sobre os cabelos. Naquele dia, o mais importante entrava pela boca, prendia no céu e ia parar no pensamento e no coração. Para receber o corpo de Cristo, o lenço foi parar no peito da menina. Dobrado ao meio, em formato de triângulo, foi alinhavado no vestido pela avó. Nesta posição, a renda aparecia e via tudo de frente. E assim, de branco e renda no peito, a menina entrou na igreja. Carregava o que nem suspeitava. Levava o que nem sabia.



À dona da renda, Maria da Penha Facó Soares